04/01/10

A CANÇÃO DO ÓBVIO

Canção do óbvio
Paulo Freire

Escolhi a sombra desta árvore
Para repousar do muito que farei
Enquanto esperarei por ti
Quem espera na pura espera
Vive um tempo de espera vã
Por isto, enquanto te espero
Trabalharei os campos e
Conversarei com os humanos
Suarei meu corpo, que o sol queimará;
Minhas mãos ficarão calejadas
Meus pés aprenderão o mistério dos caminhos
Meus ouvidos ouvirão mais
Meus olhos verão o que antes não viam
Enquanto esperarão por ti
Não te esperarei na pura espera
Porque o meu tempo de espera é um
Tempo de quefazer
desconfiarei daqueles que virão dizer-me,
em voz baixa e precavida:
é perigoso agir
é perigoso falar
é perigoso andar
é perigoso esperar, na forma em que esperas
porque esses recusam a alegria de tua chegada
Desconfiarei também daqueles que virão dizer-me
Com palavras fáceis, que já chegaste,
Porque esses, ao anunciar-te ingenuamente,
Antes te denunciam.
Estarei preparando a tua chegada
Como o jardineiro prepara o jardim
Para a rosa que se abrirá na primavera